domingo, 2 de junho de 2013

Excertos do livro "O Caminho do crescimento Espiritual" de Richard J. Foster

As Disciplinas Espirituais abrem a Porta

Quando perdemos a esperança de obter a transformação interior mediante as forças humanas da vontade e da determinação, abrimo-nos para uma maravilhosa e nova realização: a justiça interior é um dom de Deus que deve ser graciosamente recebido. A imperiosa necessidade de mudança dentro de nós é obra de Deus e não nossa. É preciso que haja um trabalho real interno, e só Deus pode operar a partir do interior. Não podemos alcançar ou merecer esta justiça do reino de Deus; ela é uma graça concedida ao homem. (continua abaixo)

Na carta aos Romanos o apóstolo Paulo esforça-se a fim de demonstrar que a justiça é um dom de Deus. Ele emprega o termo trinta e cinco vezes nessa epístola, e cada vez que o emprega fá-lo com êxito pelo fato de que a justiça não é atingida nem atingível mediante esforço humano. Uma as mais claras afirmações é Romanos 5:17: “... os que recebem a abundância da graça e o dom da justiça, reinarão em vida por meio de um só, a saber, Jesus Cristo.” Esse ensino, evidentemente, não se encontra só em Romanos mas na Bíblia toda e se apresenta como uma das pedras angulares da fé cristã.

No momento em que captamos esta compreensão palpitante, corremos o risco de um erro no sentido oposto. Somos tentados a crer que nada há que possamos fazer.

Se os esforços humanos terminam em falência moral (e tendo-o tentado, sabemos que é assim), e se a justiça é um dom gratuito de Deus (conforme a Bíblia o declara com clareza), então não é lógico deduzir que devemos esperar que Deus venha e nos transforme? Por estranho que pareça, a resposta é “não”. A análise é correta: o esforço humano é insuficiente e a justiça é o dom de Deus. O que é falha é a conclusão, pois felizmente existe algo que podemos fazer. Não precisamos agarrar-nos às pontas do dilema das obras nem da ociosidade humanas.

Deus nos deu as Disciplinas da vida espiritual como meios de receber sua graça.

As Disciplinas permitem-nos colocar-nos diante de Deus de sorte que ele possa transformar-nos.

O apóstolo Paulo disse: “O que semeia para a sua própria carne, da carne colherá corrupção; mas o que semeia para o Espírito, do Espírito colherá vida eterna” (Gálatas 6:8). O lavrador não consegue fazer germinar o grão; tudo o que ele pode fazer é prover as condições certas para o crescimento do grão.

Ele lança a semente na terra onde as forças naturais assumem o controle e fazem surgir o grão. O mesmo acontece com as Disciplinas Espirituais - elas são um meio de semear para o Espírito. As Disciplinas são o meio de Deus plantar-nos na terra; elas nos colocam onde ele possa trabalhar dentro de nós e transformar-nos. Sozinhas, as Disciplinas Espirituais nada podem fazer; elas só podem colocar-nos no lugar onde algo possa ser feito. Elas são os meios de graça de Deus. A justiça interior que buscamos não é algo que seja derramado sobre nossas cabeças. Deus ordenou as Disciplinas da vida espiritual como meios pelos quais somos colocados onde ele pode abençoar-nos.

Neste sentido, seria próprio falar do “caminho da graça disciplinada”. É “graça” porque é grátis; é “disciplinada” porque existe algo que nos cabe fazer. Em The Cost of Discipleship (O Custo do Discipulado), Dietrich Bonhoeffer deixa claro que a graça é grátis, mas não é barata. Uma vez que entendemos com clareza que a graça de Deus é imerecida e imerecível, se esperamos crescer devemos iniciar um curso de ação conscientemente escolhida, que inclua tanto a vida individual como em grupo. Essa é a finalidade das Disciplinas Espirituais.

Seria conveniente visualizar o que vimos estudando. Imaginemos uma passagem estreita com um declive íngreme de cada lado. O abismo da direita é o caminho da falência moral por meio dos esforços humanos para alcançar a justiça.

Historicamente se tem dado a isto o nome de heresia do moralismo. O abismo da esquerda é o caminho da falência moral pela ausência de esforços humanos. Este tem sido denominado heresia do antinomianismo. Essa passagem representa um caminho - as Disciplinas da vida espiritual. Este caminho conduz à transformação interior e à cura que buscamos. Não devemos desviar-nos para a direita nem para a esquerda, mas permanecer no caminho. Este está cheio de sérias dificuldades, mas também conta com incríveis alegrias. À medida que andamos neste caminho, a bênção de Deus virá sobre nós e nos reconstruirá à imagem de seu Filho Jesus Cristo. Devemos lembrar-nos sempre de que o caminho não produz a mudança; ele apenas nos coloca no lugar onde a mudança pode ocorrer. Este é o caminho da graça disciplinada.

Há um ditado em teologia moral que diz que “virtude é fácil”. Isto é verdadeiro somente até onde a obra graciosa de Deus tenha assumido o comando de nossa disposição interior e transformado os padrões de hábitos arraigados de nossas vidas. Enquanto isto não se realizar, a virtude é difícil, difícil mesmo.

Lutamos por exibir um espírito amável e compassivo; não obstante é como se estivéssemos levando para dentro algo trazido do exterior. Surge então, das profundezas interiores, a única coisa que não desejávamos: um espírito mordaz e amargo. Contudo, uma vez que tenhamos vivido no caminho da graça disciplinada por uma temporada, descobrimos mudanças internas.

Não fizemos nada mais do que receber um dom, não obstante sabemos que as mudanças são reais. Sabemos que são reais porque verificamos que o espírito de compaixão que outrora achávamos tão difícil, é agora fácil. Na realidade, difícil seria estar cheio de amargura. O Amor divino entrou em nossa disposição interior e assumiu o controle de nossos padrões de hábitos. Nos momentos desprevenidos, brota do santuário interior de nossa vida um fluxo espontâneo de “amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio próprio” (Gálatas 5:22, 23). A necessidade cansativa de ocultar dos outros aquilo que somos interiormente já não existe.

Não temos de esforçar-nos para ser bons e generosos; somos bons e generosos.

Difícil seria refrear-nos de ser bons e generosos, porque a bondade e a generosidade fazem parte de nossa natureza. Assim como os movimentos naturais de nossa vida outrora produziam lama e lodo, agora eles produzem o fruto do Espírito. Shakespeare escreveu: “A qualidade da misericórdia não é forçada” - nem o são quaisquer das virtudes espirituais uma vez que elas assumam o comando da personalidade.

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